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A petrofísica como uma carreira no setor de O&G

Autor: Gabriel Feres Nassau


Pode ser deveras complicado sintetizar o que é a petrofisica e a carreira de petrofísico, termos estes antigos e cunhados na década de 40 por Archie e Thomeer. É uma ciência que nasceu na indústria e tem por base caracterizar propriedades física das rochas. Apesar de ser um nicho muito pequeno, quando comparado a outras áreas da geociências, vem cativando cada vez mais estudantes e profissionais da área não só de O&G, mas também de mineração.


A petrofísica por si só é uma área muito diversificada e necessita da ampla interdisciplinaridade para o seu contínuo avanço. Internacionalmente, a maioria dos petrofísicos possui um perfil muito semelhante entre si, dominado por engenheiros, físicos e matemáticos; enquanto que no Brasil há uma grande quantidade de geólogos atuantes nesta área.


É natural que profissionais com diferentes formações exerçam atividades mais ou menos distintas. Essa heterogeneidade é muito importante para o aprimoramento de soluções analíticas e tecnológicas, a fim de viabilizar cálculos mais acurados e aquisições de dados cada vez melhores e com mais qualidade. Contudo, esta parte da atividade é normalmente exercida por grupos que possuem um embasamento físico e matemático mais desenvolvido.


Ao mesmo tempo, a comunidade precisa de geólogos para dar significado aos dados petrofísicos. Por exemplo, para nós geólogos, uma leitura de Raios Gama não serve apenas para dizer onde há reservatório e não-reservatório; a partir de seu comportamento, nós podemos - e devemos - ir além, inferindo informações a respeito do ambiente deposicional, composição de rochas e outros atributos geológicos. Geralmente, nós geólogos temos mais dificuldades em lidar com soluções analíticas e modelos físicos mais complexos, mas é algo que com o tempo vamos aprendendo a trabalhar, nos familiarizando e até gostando (sim, acredite). Não tem como fugir da realidade, os geólogos que optarem por trabalhar na área de petrofísica devem ter a mente aberta e saber que é uma ciência cuja premissa é a quantificação de propriedades físicas das rochas. E mais: devem ser capazes de combinar a abstração (geologia) com a quantificação (ciências físicas e matemáticas), que é muito difícil para tantos outros profissionais. Mais uma vez, ressalto a importância da quantificação. Você terá a opção de ser apenas mais um geólogo intérprete de perfil ou ser, de fato, um geólogo petrofísico.


O nosso grande objeto de estudo é a rocha, ou melhor, o resultado da interação desta com os fluidos. Ao final, o que temos que responder são “simples” perguntas como: Há presença de reservatório? Se sim, qual sua natureza? Quais são as suas condições de porosidade e permeabilidade? Quais os fluidos presentes no meio poroso? Há potencial de escoamento? Em quais situações? As perguntas, de fato, são simples; o desafio é respondê-las de maneira acurada.


Assim como na geologia em geral, falar sobre rocha no universo da petrofísica, é necessário ter o entendimento de diversas escalas (Figura 1). Começando nas escalas maiores, de maior detalhe, podemos trabalhar a textura da rocha na escala de poros, hoje possibilitada pela tecnologia de Micro-CT (microtomografia), cujo um fragmento de rocha é imageado em 3D, às vezes com resoluções na ordem de nanômetro/micrômetros. A partir desses dados é possível fazer simulações numéricas de como seria um fluxo de fluidos dentro daquela amostra e assim obter valores de permeabilidade, por exemplo; ou ainda, a condutividade elétrica da rocha, levando em consideração atributos da resolução do dado.


Em seguida, em uma escala um pouco menor, temos o core scale, onde os ensaios laboratoriais, como permeabilidade, porosidade, parâmetros elétricos, etc, passam a ser feitos já com amostras de algumas polegadas (plugs) e amostras laterais (side wall core). Estes são os ensaios mais amplamente conhecidos e manipulados.


Reduzindo ainda mais a escala, eis que os estudos chegam ao log scale, que é escala dos perfis adquiridos em poços. É nesta etapa onde os petrofísicos que trabalham com a avaliação de reservatórios gastam grande parte do seu tempo. É necessário fazer a organização da base de dados, controle de qualidade dos perfis adquiridos e, por fim, a avaliação de fato. É aqui onde todas as análises laboratoriais realizadas devem ser integradas a fim de serem representadas como propriedades “contínuas” por todo o poço.


Note que as análises iniciaram com ordem de grandeza de nanômetro/micrômetro e chegaram a dados que possuem resolução na ordem de dezenas de centímetros. Agora, devemos mais uma vez trabalhar com a subida de escala. Uma vez entendida as propriedades do sistema rocha-fluido no escala dos perfis, temos que enxergar essas propriedades na escala da sísmica – e é bem fácil de ser compreendida –, uma vez que as informações de poços são pontuais na dimensão de um reservatório de petróleo, e o único dado que pode nos trazer o caráter espacial de toda a jazida é a sísmica.

Figura 1: As diferentes escalas de propriedades petrofísicas a serem modeladas e trabalhadas. Da microtomografia à sísmica. Fonte: [1],[2],[3],[4].


Desta maneira, o objetivo final é termos modelos de rocha - fluido que consigam ser levados para uma escala cada vez menor e que possam ser utilizados para entender não mais o comportamento petrofisico de uma amostra de 1,5 x 2 polegadas, mas sim o de uma estrutura de centenas de metros a quilômetros de extensão.


É importante ter a noção de que não é possível carregar toda a informação da microtomagrafia para a escala de perfil, tampouco para a sísmica. Este é um dos trabalhos mais árduos e relevantes de um petrofísico: controlar quais as informações mais importantes a serem levadas de uma escala para a outra. Como um filtro de passa baixa, os dados vão cada vez mais perdendo resolução e, consequentemente, informação, de modo que somente os atributos considerados “mais representativos” serão levados adiante. Contudo, quais são os atributos “mais representativos”? Quem avalia se uma determinada fácies está bem representada ou modelada? E o que diferencia uma fácies de outra na petrofísica?


Cabe ao petrofísico lidar com esse transporte de propriedades entre as escalas e como melhor modelar as características mais significativas das rochas em cada uma delas. Uma analogia interessante é pensar que da mesma forma que tiramos conclusões geológica regionais com base em conjunto de dados de afloramentos, fazemos o mesmo com a petrofísica. Uma dobra parasítica de alguns centímetros não irá aparecer em um mapa geológico de 1:50.000, mas suas informações como direção de plano axial, vergência e assimetria nos dizem e explicam muita coisa num contexto mais amplo.


Agora vamos com calma. Tentaremos entender um pouco o que foi dito até aqui. Resumidamente, para responder aquelas “simples” perguntas devemos entender como é a geometria dos poros, como eles se comunicam e como que isso é representativo em diferentes níveis de detalhe. A partir disso, surgem três propriedades muito importantes: a porosidade, a permeabilidade absoluta (quando só há um fluido no sistema) e as curvas de pressão capilar de uma rocha. Esta é controlada pelas duas primeiras e tem uma grande relevância, seja para entendermos como foi a história de acumulação de uma jazida, o potencial selante de uma rocha ou a distribuição dos diferentes fluidos nos poros.


Posteriormente, precisamos entender como é o escoamento do reservatório - e para isso, é necessário conhecer como é o comportamento da permeabilidade quando há mais de um fluido no meio poroso (permeabilidade efetiva ou relativa, propriedade diferente da permeabilidade absoluta). Havendo mais de uma fase imiscível, há uma certa competição entre elas durante o escoamento, de forma que uma “atrapalha” a outra. A permeabilidade é um atributo que não depende só das características faciológicas/petrofísicas, mas também das propriedades de estado, ou termodinâmicas, dos fluidos presentes nos sistemas. É a permeabilidade relativa quem vai ditar os fluxos fracionários de cada fase em uma determinada rocha em uma condição específica de saturação dos fluidos (Figura 2).

Figura 2: O caminho da modelagem petrofisica, da porosidade à estimativa de vazão de fluidos. Fonte: [5],[6],[7],[8].


Para fechar, gosto de resumir que a atividade de um petrofísico Log Analist é como uma atividade de detetive, um quebra cabeça. Buscamos estudar as propriedades das rochas desde um nível de extremo detalhe e como essas características se refletem nos perfis de poços. Como bons geólogos que somos, buscamos entender como essas propriedades se correlacionam com diferentes rochas, em diferentes contextos deposicionais e sua distribuição espacial em uma jazida.


Uma modelagem petrofísica robusta necessita de um conhecimento amplo de princípios físicos e fenomenologias. Então, um geólogo que se dispõe a mergulhar nesse mundo tem uma vantagem: a facilidade de intermediar e entender os processos na cadeia de E&P, sendo o elo perdido entre os geólogos “puros” e os engenheiros de reservatório.

“O livro do mundo está escrito em linguagem matemática” (Galileu Galilei)

Referências

[1] Blue Scientific, disponível em:< https://www.blue-scientific.com/micro-ct-geology>. Acesso em 17/08/2020

[2] Schlumberger, 2012. XL-Rock Large volume rotary sidewall coring service. Disponível em https://www.slb.com/-/media/files/fe/brochure/xl-rock-br.ashx. Acesso em 17/08/2020

[3] Dug, Petrophysics, disponível em: https://dug.com/geoscience-services/petrophysical-processing-interpretation. Acesso em 17/08/2020

[4] Schlumberger, Petrel Petrophysics Modeling. Disponível em:https://www.software.slb.com/products/petrel/petrel-geology-and-modeling/petrophysical-modeling . Acesso em 17/08/2020

[5] Kansas University - Kansas Geological Survey, 2001, Geology of Petroleum. Disponível em: http://www.kgs.ku.edu/Publications/Oil/primer03.html. Acesso em 17/08/2020

[6] Kantzas, A., Bryan, J., Taheri, S. Fundamentals of fluid flow in porous media. Disponível em: https://perminc.com/resources/fundamentals-of-fluid-flow-in-porous-media/. Acesso em 17/08/2020

[7] ThermoGIS. Subsurface data. Disponível em:< https://www.thermogis.nl/en/subsurface-data>. Acesso em 17/08/2020

[8] Maksimova, E. N., Parfenov, N.A., Belozerov, B.B. 2018. The integrated approach to permeability adjustment based on the simultaneous well log and well test interpretation. Paper SPE-191690-18RPTC-MS

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